sexta-feira, 30 de junho de 2006

O que fazer com o processo de colocação de professores?

Numa recente entrevista concedida à revista Visão, a Ministra da Educação, referindo-se ao actual processo de colocação de professores utilizou os adjectivos "absurdo" e "irracional" para qualificar tal processo, tendo defendido a ideia de conceder uma maior autonomia às escolas, sobretudo às mais "difíceis" para que estas possam vir a escolher, remunerar e compensar os docentes que considerarem mais qualificados.
Não desfazendo as boas intenções da Ministra, nem rejeitando por completo a hipótese de acabar com os concursos nacionais, que, muitas vezes, levam a situações absurdas de escolas com uma quadro docente espartilhado, já para não falar de famílias divididas e índices de motivação laboral muito reduzidos, penso que a possibilidade de serem as escolas a contratarem os seus professores poderia trazer muitos benefícios em termos de maior estabilidade do corpo docente e de aumento do sucesso escolar. Mas, com que custos?
Não sejamos ingénuos! O fim dos concursos nacionais e a aposta nos concursos a nível de escola levariam a situações mais gravosas do que aquelas que existiam no tempo dos mini-concursos. Por um lado, todo o processo de recrutamento docente ficaria mais burocrático, ao mesmo tempo que se correria o risco de tornar a colocação de docentes mais sujeita a situações de imparcialidade. Por outro lado, com o número de agrupamentos de escolas que existe, a candidatura de centenas de professores a uma escola teria elevados custos aos níveis monetário, processual e temporal.

sexta-feira, 23 de junho de 2006

Complicadex e desleixadex!!!

Depois de tido a primeira de quatro reuniões de avaliação de turmas dos 7º e 8º anos de escolaridade fico com a ideia de que a burocracia na Educação não pára de aumentar. De facto, em 8 anos de serviço (bem sei que, para alguns, ainda sou novato nestas andanças da Educação!) tenho notado que a papelada que se tem de preencher a cada momento de avaliação, sobretudo nas turmas do 3º ciclo (quando comparados com as do secundário), é cada vez em maior número. Isto já para não falar nos procedimentos que têm de ser tomados por um conselho de turma quando este considera que um aluno já com, pelo menos, uma retenção no seu percurso escolar deve ser retido (até já parece que é proibido dizer a palavra "reprovar"): veja-se o caso da justificação da retenção de um aluno com base na avaliação de uma série de parâmetros, através de cruzes, que vão desde a assiduidade do aluno até à sua capacidade para se evidenciar de forma notória nalguma actividade... Quem é professor sabe do que falo!!! Enfim, tudo está previsto para facilitar as progressões e complicar as retenções dos alunos...
A verdade é que estou de rastos depois da reunião de avaliação de hoje. Começou às 9H. e só terminou depois das 14H. Pelo meio assisti a discussões entre professores, formas de pressão exercida a colegas para subirem a proposta de nível atribuída, desconhecimento das formalidades a tomar por alguns dos intervenientes; enfim, uma série de peripécias que demonstram a falta de profissionalismo e seriedade de alguns docentes, o que a juntar à incrível dose de burocracia que acompanha estas reuniões, resulta numa maior propensão para transitar os alunos de ano. Imagine-se que há colegas que chegam a defender, em plena reunião, a transição de alunos para que a reunião decorra de forma mais rápida para, assim, poderem ir mais cedo para as suas casas, apenas porque são de longe! Andamos a brincar ou quê? Por isso é que defendo uma avaliação séria e rigorosa do desempenho do trabalho docente...
Bem vistas as coisas, a Ministra da Educação até tem razão num aspecto: há que ser rigoroso na avaliação dos professores. Mas, convinha que a Ministra não se esquecesse de trazer para a sua pasta o plano Simplex. É que, com tanta papelada e burocracias extremas o professor mais parece uma funcionário administrativo e não tanto um profissional da educação...

sábado, 17 de junho de 2006

O fim das aulas e as propostas de avaliação... Sucesso escolar ou não???

As aulas terminaram ontem, dia 16 de Junho, na escola onde lecciono para as turmas do 7º, 8º, 10º e 11º anos, pois já uma semana antes tinham finalizado para as do 9º e 12º anos, devido à época de exames nacionais.
Agora, é tempo de reflectir sobre as propostas de avaliação a apresentar nos conselhos de turma (alguns já se realizaram). Em relação às minhas 8 turmas, não me posso queixar dos níveis que tenho para apresentar. Vejamos a percentagem de níveis negativos a Geografia por turma:
- 7º B: em 24 alunos proponho 8 níveis inferiores a três (33%)
- 7º C: em 27 alunos proponho 4 níveis inferiores a três (15%)
- 8º A: em 26 alunos proponho 9 níveis inferiores a três (35%)
- 8º E: em 20 alunos proponho 1 nível inferior a três (5%)
- 9º A: em 19 alunos proponho 1 nível inferior a três (5%)
- 9º B: em 26 alunos proponho 3 níveis inferiores a três (12%)
- 9º C: em 19 alunos proponho 2 níveis inferiores a três (11%)
- 10º G: em 23 alunos proponho 2 níveis inferiores a dez valores (9%)
Em termos gerais, o panorama da disciplina de Geografia às 8 turmas que lecciono é, pois, de 16,4% de níveis negativos (30 em 184), o que penso ser razoável...
Será que este tipo de percentagem se enquadra nos parâmetros definidos pelo Ministério da Educação no que concerne ao sucesso escolar? Não sei. Apenas sei que tento ser o mais competente, rigoroso e justo na forma de exercer a minha profissão, pelo que não serão as directrizes emanadas pela tutela que farão com que seja condescendente na hora de avaliar os meus alunos...

quinta-feira, 15 de junho de 2006

Afinal, o que se ganhou com a greve?

Depois da greve convocada pela Fenprof e mais alguns sindicatos menos conhecidos e da manifestação que se lhe seguiu em Lisboa, fica a questão: qual o contributo da greve para a resolução dos problemas mais prementes da Educação???
Sejamos frontais. A greve de quarta-feira teve na opinião pública em geral uma reacção negativa e crítica, por duas razões principais: por um lado, a falta de bom-senso na escolha do dia para a greve (na véspera de um feriado) e, por outro lado, o desconhecimento público da proposta de alteração do ECD veiculada (se existir...) pelos sindicatos que foram a favor da greve. Também não nos podemos esquecer que, como sempre, os números apresentados pela tutela e pela Fenprof quanto à adesão de greve divergem em muito: de menos de 30% a mais de 80%. O mais certo é que uns e outros estejam errados... A comunicação social reservou para o final dos serviços noticiosos a reportagem sobre a manifestação de professores em Lisboa e o que se viu (pelo menos na SIC) não foi muito dignificante para a classe docente: desde professores que mais pareciam saídos de um filme de terror (falo de uma senhora que toda a gente deve ter visto e que parecia uma viúva vistosa) até docentes empunhando cartazes em que a figura da Ministra da Educação aparece travestida de drácula, tudo se viu, menos a preocupação de informar convenientemente a opinião pública sobre as mudanças propostas pela tutela e as contra-propostas (caso existam) defendidas pelos sindicatos.
Enfim, penso que esta greve em nada contribuiu para que possamos levar a efeito a concretização das medidas essenciais para a dignificação da nossa classe profissional. Todos os comentadores foram unânimes ao afirmar que a Fenprof apenas poderá ser ouvida e tida em conta de forma séria se deixar de actuar como se actuava há trinta anos atrás. Os tempos são outros, pelo que o sindicalismo não pode continuar a ser confundido com corporativismos dependentes de directrizes partidárias. Até o Presidente da República deu a entender que, efectivamente, a opinião pública está, na sua maioria, com a Ministra...
Esperemos que as negociações com a tutela decorram de forma séria e atenta, por forma a que aos pontos mais duvidosos da proposta ministerial (a categoria de professor titular, as exigências para a progressão na carreira e a forma de avaliação de desempenho do professor) sejam feitas contra-propostas credíveis, mas não menos exigentes...

sábado, 10 de junho de 2006

A proposta do novo estatuto da carreira docente - IV

Uma questão que tem suscitado da parte dos sindicatos de professores alguma contestação é a que diz respeito à proposta ministerial relacionada com o regime de faltas. A situação actual é, como sabemos, injusta em relação à maioria dos trabalhadores portugueses, para além de que não defende aqueles docentes que não costumam faltar, já que na actual lei não existe qualquer tipo de diferenciação entre docentes que faltam muito e os que são assíduos, o que incentiva, muitas vezes, a que se banalize o acto de faltar. É pois necessário implementar regras mais sérias neste aspecto...
A proposta ministerial, no seu artigo 47º, aplica a assiduidade como uma das condições para se progredir na carreira: "a atribuição da menção qualitativa igual ou superior a Bom fica, dependente do cumprimento de, pelo menos, 97% do serviço lectivo que ao docente tiver sido distribuído no ano escolar", excluindo-se daqui as faltas dados em situações de licença de maternidade e paternidade, doença prolongada e obrigações legais. Este combate ao absentismo é, porventura, demasiado exigente, na medida em que as faltas dadas ao abrigo de consultas médicas do próprio ou de descendentes, bem como de acções de formação não aparecem previstas na lei, pelo que, na prática, muitos docentes não conseguirão cumprir os 97% de aulas exigidas... Uma coisa é certa: a assiduidade irá aumentar e o número de faltas dadas ao abrigo do artigo 102º (desconto no período de férias) irá diminuir drasticamente. A Ministra dirá: "para grandes males, grandes remédios". Apesar de concordar com o espírito da lei, penso que fixar um valor mínimo de 3% para as situações de ausência às aulas, seja para os professores que vivem na localidade onde dão aulas, como para os que são de longe, seja para aqueles que têm filhos, como para os que não têm, é esticar demasiado a corda... Lá se irão perder pelo caminho mais uma série de menções de Bom!!!
Quanto aos cinco dias que deverão antecipar o pedido de autorização ao CE para faltar ao abrigo do artigo 102º, considero esta uma medida positiva, desde que tal exigência seja acompanhada da possibilidade do docente que irá fazer a substituição do colega de ser avisado com antecedência da referida substituição para assim poder preparar convenientemente a aula de substituição, situação que agora não acontece em muitas escolas e configura no professor substituto a obrigação de se desenrascar em cima da hora... Quanto ao plano da aula a apresentar pelo professor faltoso definido no artigo 94º, penso que tal deveria obrigar a que a substituição fosse efectuada por um colega da mesma área disciplinar...
Finalmente, quanto ao prémio de desempenho definido no artigo 63º, considero que tal proposta de incentivo ao bom desempenho profissional é positivo, mas apresenta uma incongruência que passa pelo facto de o mesmo estar sujeito a uma quota imposta pelo Ministério, o que na prática irá impedir muitos docentes de conseguirem alcançar tal menção...
Enfim, esperemos agora para ver como decorrem as negociações entre o Ministério da Educação e os sindicatos de professores, embora se saiba que a greve decretada por um dos sindicatos constitui um mau sinal. Nem que seja pelo simples facto de que a greve deve ser tida como um dos últimos recursos de luta a apresentar e não como uma forma de pressão no início de uma negociação...

segunda-feira, 5 de junho de 2006

A proposta do novo estatuto da carreira docente - III

Prosseguindo com a análise da proposta do ME para o novo Estatuto da Carreira Docente, centremo-nos em dois dos pontos mais controversos da referida proposta ministerial: a progressão na carreira e a avaliação do desempenho individual do professor.
O artigo 38º da proposta do ME indica que a progressão na carreira docente "depende da permanência de seis anos no escalão imediatamente anterior, computados como tempo de serviço efectivo em funções docentes, com avaliação do desempenho de, pelo menos, de Bom, e ainda da frequência, com aproveitamento, de módulos de formação contínua equivalentes, no mínimo, a 25 horas anuais, durante aquele período". Poderia concordar inteiramente com este ponto caso não viesse a existir a política de quotas que se prevê para a atribuição de menções de Bom, o que a ser verdade irá alterar a expectativa de muitos docentes em poderem progredir na carreira.
No entanto, a verdadeira armadilha surge quando aparecem as condições para se poder chegar à categoria de professor titular. Por um lado, não se dá a conhecer o número de vagas postas a concurso anualmente para aqueles que se queiram candidatar a professor titular; por outro lado, a fixação de dezoito anos de carreira como condição mínima para se poder almejar a ser professor titular faz pensar que muitos docentes, face às restrições impostas para a subida de escalão ficarão "presos" ao terceiro escalão, com sérias dificuldades de progredir na carreira. A lógica de prestar provas perante um júri regional, tal como vem descrito no artigo 39º, com a presença de professores universitários dá a imagem de alguma subserviência do ensino não universitário perante o universitário...
Mas, é no que respeita ao processo de avaliação do desempenho dos professores que encontramos algumas das questões mais pertinentes. Ponto assente é o de que urge alterar por completo o actual processo de avaliação do trabalho docente... Mas, ao menos que fosse para elevar de forma credível o nível de exigência do mesmo e não para aumentar os processos burocráticos, como vem referenciado no artigo 45º da proposta ministerial com o preenchimento de fichas e mais fichas... Atente-se depois ao artigo 46º, onde se prevê como items de avaliação, entre muitos outros aspectos, os resultados escolares dos alunos, as taxas de abandono escolar e a apreciação realizada pelos pais dos alunos em relação à actividade lectiva (é o que vem na proposta) dos docentes. Ora, como é que se pode colocar no mesmo saco de avaliação as realidades de escolas díspares, com condições diferentes e "públicos" diversos? É que não é nada fácil leccionar e ter bons resultados numa escola de um meio social problemático, onde impera o desemprego e a falta de prespectivas na população estudantil!!! Quanto à intervenção dos pais, penso que a mesma poderia ser ponderada, mas apenas para os pais que demonstram interesse pela vida escolar dos seus filhos e que não esquecem que, também eles, devem contribuir para a formação cultural dos mesmos. É que não podemos só falar em direitos dos pais e esquecer os deveres que lhes são devidos e exigidos... Mas, teria que haver muito cuidado naquilo que se perguntaria aos pais, a fim de que os docentes não fiquem reféns das opiniões dos pais... No mesmo artigo define-se que a observação de três aulas do docente deve ser feita pelo coordenador de departamento curricular, pelo que deixo a questão: quem observa as aulas do coordenador de departamento curricular???
No póximo artigo continuarei com a análise da proposta ministerial. Aceitam-se contributos...

quinta-feira, 1 de junho de 2006

A proposta do novo estatuto da carreira docente - II

Em conformidade com o que referi no artigo anterior continuo com a análise à proposta do ME para o novo ECD. Em relação às duas categorias de docentes que a proposta veicula (professor e professor titular), como vem no artigo 34º, embora a intenção ministerial possa ser a de melhorar a organização e metodologias de trabalho a desenvolver por cada um dos departamentos da escola e outros órgãos da escola, não tenhamos dúvidas que a mesma poderá, infelizmente, aumentar as desigualdades e conflitos entre docentes, até porque falamos de "funções diferenciadas pela sua natureza, âmbito, grau de responsabilidade e nível remuneratório". Digo conflitos porque, na minha modesta opinião, a idade, nesta profissão, não constitui um factor exacto de maior empenho, capacidade ou responsabilidade. Bem sei que não fica nada bem, no politicamente correcto deste país, termos alguém de 30 anos com um cargo "superior" ao de um seu colega de trabalho de 50 anos de idade, mas, por exemplo, quem me diz que um professor com dez anos de serviço, mas com um curso de mestrado em organização escolar, não poderá desempenhar melhor o cargo de coordenador de departamento do que um docente com 25 anos de carreira, contrariado, sem vontade de ocupar o dito cargo e que não investiu nada na melhoria da sua formação académica?
A minha proposta seria a de fomentar a democracia na escola. Todos os docentes de cada departamento teriam uma palavra a dizer sobre a melhor pessoa a indicar para ocupar o cargo de coordenador de departamento, baseando-se tal escolha não na idade, mas sim na competência, tomando-se a mesma estratégia para todos os outros cargos da escola...
Outra questão pertinente que ressalta da proposta do ME é a do artigo 36º, no seu número 2. Quem se der ao trabalho de ler todas as competências que o ME remete para a profissão docente, certamente não estranhará que o que o ME quer é que o professor seja muito mais do que um formador: há que ser orientador, psicólogo, animador, confidente, organizador de papelada, gestor, e professor claro, enfim, temos que ser homens e mulheres dos sete instrumentos... São mais de vinte deveres que o ME nos impõe a cumprir!!!