quarta-feira, 7 de maio de 2014

A propósito da existência ou não de um conflito de gerações na classe docente...

Numa recente entrevista concedida por Nuno Crato à TVI24 foi utilizada, pelo Ministro, a expressão "nova geração de professores" que parece ter deixado muitos colegas incomodados e perturbados pela forma como Crato fez passar a ideia de que é seu anseio que, do ponto de vista científico, "a nova geração de professores seja tão boa ou melhor do que a actual" (palavras de Crato), numa lógica de qualidade crescente.
Ora, a ideia que passou de que, nas nossas escolas, estão em confronto duas gerações de professores deixou muita gente incomodada, pelo que gostaria, uma vez mais, de dar a minha opinião sobre este assunto.
Convém desde já olhar para os números e constatar que, por exemplo, no ensino secundário a grande maioria dos professores portugueses tinha, em 2011 (dados mais recentes), menos de 50 anos de idade, o que reflecte a relativa juventude da nossa classe docente, ao contrário do que acontece na generalidade dos países europeus.
Mas, façamos uma reflexão sobre o mal-estar instalado nas nossas escolas entre aqueles que têm mais e menos idade. Por um lado, temos os professores mais novos que se sentem injustiçados (na minha opinião com razão) por nunca poderem almejar a ter direito às regalias e benesses que os seus colegas mais velhos puderam alcançar, nomeadamente em termos salariais e de redução da carga lectiva. Claro que, muitas vezes, a resposta de alguns dos colegas mais velhos é a de que os docentes mais novos são uns invejosos por terem salários mais baixos do que os seus colegas mais velhos. Não creio que a questão seja de inveja, mas sim de injustiça...
Já os colegas mais velhos dizem-se, muitas vezes, desiludidos por terem perdido alguns dos direitos que consideravam como adquiridos para sempre: a redução da componente lectiva nos termos em que existiu durante muitos anos (em que na componente não lectiva não tinham de estar na escola - lembram-se desses tempos?), a possibilidade de se poderem reformar ainda antes dos 65 anos de idade nos termos em que vigorou durante muitos anos (lembram-se de quando muitos docentes do 1º ciclo se reformavam com cinquenta e poucos anos?) e, claro, algo que atingiu tanto os professores mais novos como os menos novos: o fim das progressões automáticas na carreira e o congelamento salarial...
Lembro-me de há uns meses atrás ter escrito um post em que defendia que Portugal deveria ter um regime salarial docente semelhante ao do Reino Unido ou da Dinamarca (onde a diferenciação salarial entre os docentes mais novos e mais velhos é muito reduzida e onde um docente com 15 anos de serviço e um seu colega com 30 anos de serviço auferem o mesmo salário) e o que mais surgiu na caixa de comentários desse post foram críticas de colegas mais velhos a apelidarem-me de invejoso por defender uma ideia que já existe noutros países da UE. Aliás, os piores dos argumentos que se podem utilizar para contrariar esta posição de maior homogeneidade salarial é a boçalidade do "tu tens é inveja", "cresce e aparece", "sabes lá tu o que é a vida"! Muitos destes colegas em final de carreira esquecem-se que também eles já tiveram 15 ou 20 anos de serviço e que não gostariam de ser tratados de forma prepotente pelos colegas mais velhos. Tal como deveriam parar para pensar que os seus colegas mais novos quando chegarem aos 30 ou 40 anos de serviço não terão direito às regalias e benesses que agora os colegas mais velhos ainda podem usufruir...
Felizmente que há colegas que estão perto da reforma e que sabem ouvir e respeitar as opiniões dos mais novos. Até há colegas que compreendem os limites que a idade lhes impõe e que pedem ajuda aos mais novos naquilo que consideram necessário. Tal como há colegas mais novos que vêem a experiência de alguns dos seus colegas mais velhos como uma mais-valia que deve ser aproveitada, para bem da escola, da melhor maneira possível. Enfim, como se costuma dizer, há de tudo...
Enfim, a idade constitui, sem dúvida, sinal de experiência, mas também deveria ser prova de bom-senso e de maturidade. Ora, muitas vezes parece que a idade se traduz num sinal de despotismo, intransigência, arrogância e prepotência que deitam por terra tudo aquilo de bom em que a idade se deveria traduzir. É pena que ainda existam colegas que apresentam estes tiques de sobranceria, mas, felizmente que há excepções. Mas não tenhamos dúvida que o mal-estar intergeracional tende a agravar-se e é nos tempos de austeridade, como o que actualmente atravessamos, que esta realidade mais se nota...