quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Reduzir o número de professores? Ainda mais? A OCDE bem que podia fazer uma análise mais apurada dos números...

A OCDE veio a Portugal aconselhar o Governo a reduzir o número de professores e de polícias. Não vou aqui argumentar a favor ou contra a redução do número de polícias; apenas digo que me parece que os polícias deviam andar mais na rua e estarem menos afectos a serviços burocráticos de secretaria. Mas, com este artigo interessa-me sobretudo demonstrar que a argumentação utilizada pela OCDE para defender a redução do número de docentes incorre num erro que deveria ser rapidamente corrigido. E o erro a que me refiro diz respeito ao facto desta análise (feita de forma tão simplista pela OCDE) se basear apenas e tão só na operação aritmética de dividir o número de alunos matriculados no ensino público (cerca de 1 milhão e trezentos mil alunos) pelo número de professores afectos ao MEC (cerca de 130 mil). Com base nesta simples conta de dividir é claro que o resultado será uma média aproximada de 10 alunos por professor. E é com esta argumentação que a OCDE vem dizer que (ainda) há professores a mais!!!
E porque razão não faz a OCDE uma análise mais apurada dos números? Porque não pega no número de professores que, efectivamente, lecciona? É que, com vista a uma análise séria, a estes 130 mil professores que estão no sistema deveriam ser "retirados" todos os professores que estão em cargos de direcção e que não leccionam, para além de todos aqueles que estão destacados noutros serviços e organismos dos Estado e que, efectivamente, não dão aulas. E, claro, aqueles que estão de baixa prolongada? E os que têm redução da sua componente lectiva e que, portanto, têm menos alunos a seu cargo? E os que estão nas escolas com horário incompleto? E, por aí fora...
É que apurar o rácio alunos/professor apenas com base no número total de alunos e de professores presentes no sistema público de ensino é demasiado simplista quando queremos comparar a realidade portuguesa com o que ocorre nos outros países da OCDE. 
Claro que não sou daqueles que ignora que durante muitos anos tivemos demasiados professores nas nossas escolas a terem poucas turmas e que pouco ou nada faziam na escola nos tempos que diziam respeito à redução da sua componente lectiva pela questão da idade. E também não ignoro que nos tempos em que chegámos a ter mais de 160 mil professores na Escola Pública havia um claro desperdício dos recursos humanos existentes nas escolas. A redução do número de professores que havia a fazer já foi feita (possivelmente até em demasia) e o aumento do número de horas lectivas e não lectivas (passadas efectivamente na escola) tem sido uma realidade nos últimos anos. Agora, ter que levar com estes estudos da OCDE a dizer que ainda temos que reduzir o número de professores, com base na simples relação do número de alunos e de professores existentes no sistema é um disparate. Basta analisar as listas enormes de mobilidade por destacamento nos mais diversos serviços do Estado que a DGRHE publica todos os anos para perceber que há milhares de professores que, efectivamente, pertencem às escolas, mas não estão nas escolas...
E porque não questiona a OCDE o MEC sobre o número de professores que, efectivamente, estão nas escolas a dar aulas? O MEC tem esses números e, certamente que, com base nesses dados reais e concretos, o rácio alunos/professores seria muito superior ao número que a OCDE e o MEC apresentam. Não lhes interessa, não é???
Outra questão importante que merecia reflexão tem que ver com a dispersão curricular. Uma redução do número de disciplinas por ano de escolaridade (sobretudo no 3º ciclo) só teria benefícios para professores e alunos. Cada professor deixaria de ter tantas turmas a seu cargo (basta pensar que com disciplinas com um bloco de aulas por semana, cada professor pode chegar a ter nove turmas a seu cargo e, portanto, mais de 200 alunos) e os alunos passariam a ter algumas disciplinas com maior regularidade semanal, acompanhando melhor a matéria leccionada e, certamente, que os resultados seriam melhores. 
A redução do número de professores está feita. Os números provam-no. E atenção que apenas aqui apresento os dados relativos ao ano lectivo 2012/2013, pois no presente ano lectivo, com a redução do número de colegas contratados e a aplicação das rescisões amigáveis, o número de professores afectos ao ensino público deve estar próximo dos 120 mil!!! Ou seja, uma redução de mais de 40 mil professores em apenas 10 anos... É verdade que há 10 anos atrás tínhamos professores a mais ou, pelo menos, estavam subaproveitados. A redução no número de docentes foi feita. E não há dúvidas que os recursos humanos têm sido melhor aproveitados (instituíram-se os apoios, as tutorias, as assessorias, etc.). Agora, há que deixar de ver a Educação numa lógica de procura de poupanças dos recursos financeiros (que correspondem, grosso modo, à redução dos salários dos professores) e devolver à profissão docente aquilo que os últimos governos lhe retiraram: a dignidade...
Para quem quiser ficar a saber um pouco mais sobre estes números pode fazer uma consulta aqui, aqui e aqui.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Será que a descentralização do sistema de colocação de professores resolve mesmo os problemas? Não me parece e digo-o porquê...

Durante um mês inteiro, enquanto o país assistia boquiaberto à catadupa diária de notícias sobre o caos ocorrido na Educação, com centenas de escolas sem muitos dos professores necessários, com milhares de alunos com furos nos seus horários e com a confusão total da (des)colocação de professores, não ouvimos uma única palavra do Presidente da República sobre o assunto que mais se debateu (e continua a debater) no país. Ora, na única vez que Cavaco Silva fala sobre o assunto, é levantada a ponta do véu da solução que muitos (governantes, jornalistas, comentadores, etc.) avançavam já há muito tempo para a resolução do problema: a descentralização da colocação de professores. 
Mesmo antes de ser Ministro da Educação, Nuno Crato já defendia o fim do concurso nacional de colocação de professores. Daí que tenha aprofundado a autonomia das escolas (que são já 1/3 do total das escolas públicas) iniciada com Maria de Lurdes Rodrigues. As autarquias, com a sua inclusão nos conselhos gerais das escolas não renegam a possibilidade que lhes sejam concedidas maiores competências ao nível do recrutamento do pessoal docente e não docente. Também as associações de pais e encarregados de educação vieram elogiar as palavras do Presidente da República. A maioria dos comentadores políticos e jornalistas também defende que sejam as escolas a recrutarem os seus professores. E, claro, não há nenhum diretor (pelo menos que eu saiba) que não prefira ter uma palavra a dizer na hora de seleccionar o seu corpo docente. Ou sejaapenas os sindicatos e os professores estão contra a ideia de que se acabe com o sistema nacional de colocação de professores baseado na graduação profissional. Todos sabemos os motivos...
Assistindo aos programas televisivos onde se tem debatido este assunto (Opinião Pública da SIC, Antena Aberta da RTP e muitos outros) dá para perceber que quase toda a gente, com exceção dos professores, vê a descentralização do sistema de colocação de professores como o caminho a seguir. Cavaco Silva apenas falou em "descentralização", sem ter sido devidamente assertivo em relação ao que verdadeiramente defende. Nuno Crato, sentindo-se protegido por Cavaco, veio logo corroborar da opinião do PR, defendendo maior autonomia para as escolas nesta matéria. E, claro, as escolas e os seus diretores agradecem. É que convém que nos coloquemos na pele de um diretor de uma qualquer escola. Certamente que iríamos preferir que fossemos nós próprios a escolher os professores a contratar. Contudo, também sabemos que qualquer processo desse género, a ser feito de forma séria, rigorosa e imparcial, é tão ou mais burocrático que qualquer sistema nacional de colocação de professores. Por outro lado, parece-me que o sistema nacional de colocação de professores, baseado na graduação profissional e imune a pressões externas, é o mais justo e rápido de ser efectivado. A descentralização faz-me recordar os antigos "miniconcursos", mas agora numa lógica de centenas de miniconcursos espalhados por todo o país, com milhares de currículos entregues em cada escola à espera de análise, ponderação e decisão. Burocracia excessiva e desnecessária...
Quanto a mim, a solução é muito simples e não será novidade para quem dá aulas. Esta passa, sobretudo, por antecipar etapas no processo de colocação de professores. Em Fevereiro cada escola deve fazer uma perspectiva do número de professores que necessitará no ano seguinte para cada grupo de recrutamento, informando o MEC das suas necessidades. Depois do MEC lançar as vagas e dos professores concorrerem, os resultados das colocações devem sair em Abril. No mês de Maio devem ser feitos os reajustes (mobilidade interna) e em Junho, no final do ano lectivo, todos os professores podem saber em que escola vão leccionar no ano seguinte. Em Setembro, com as turmas definidas, caso haja grupos disciplinares com horas lectivas a menos para os professores colocados, aproveita-se esse desajustamento em prol dos alunos, com a constituição de pares pedagógicos e apoios. O importante mesmo seria que cada escola tivesse no primeiro dia de Setembro o seu corpo docente devidamente estabilizado, sem falta de professores. E, caso faltasse algum docente (por baixa médica, maternidade ou outra razão) recorria-se, de forma célere, à bolsa nacional de professores contratados, tendo como critério único a graduação.
Claro que há quem venha dizer que isso impossibilita que os diretores possam escolher os seus professores, estando sujeitos a que lhes venha "calhar" professores incompetentes (que também os há, como em qualquer outra profissão) nas escolas que dirigem. Ora, a avaliação docente deve servir precisamente para diferenciar aqueles que trabalham daqueles que fazem que trabalham. E deve ser na esfera da avaliação docente (séria, rigorosa e imparcial) que as rédeas devem ser tomadas a fim de melhorar o serviço docente e colocar os "professores baldas" na ordem. Sim, porque quero crer que esses, os baldas, são uma exceção e facilmente "apanhados", pois a maioria dos professores que estão nas escolas preocupam-se em dar o melhor de si. Até porque os diretores das escolas sabem muito bem quem são os professores que "dão o litro" e os que fazem de conta (e às vezes nem isso!) que dão...

domingo, 12 de outubro de 2014

Um mês passou. E será que Crato aguentará outro mês no cargo? Custa a acreditar...

Há um mês atrás, Passos Coelho afirmava em Sernancelhe, na abertura do ano escolar, que a colocação de professores havia corrido melhor que no ano anterior e que tudo estava a correr dentro da normalidade. É claro que Passos Coelho, a leste do burocrático e complicado processo de colocação de professores, disse o que disse porque Nuno Crato certamente lhe havia dado garantias dessa normalidade. Ora, logo no próprio dia pareceu claro a todos que estaríamos perante o pior início de ano escolar desde há muitos anos e, a verdade é que, o que se tem lido e visto nos órgãos de comunicação social neste último mês em termos de notícias sobre Educação deveria fazer corar de vergonha quem tutela a pasta da Educação.
O Expresso notícia agora aquilo que muitos já suspeitavam: Nuno Crato colocou o lugar à disposição, mas Passos Coelho não aceitou. Não apenas devido à discussão do Orçamento de Estado de 2015, mas também por óbvios interesses político-partidários, numa lógica de estratégia eleitoral. Passos Coelho não quis dar parte fraca e fazer aquilo que a oposição exigia e que os comentadores políticos adivinhavam. 
Crato colocou o seu lugar à disposição. No entanto, o que deveria ter feito, caso tivesse (ainda) algum respeito pelos professores, alunos e pais afectados por tanta trapalhada e incompetência, seria, pura e simplesmente, sair pelo seu próprio pé. Demitir-se. Avisava Passos Coelho da sua decisão (irrevogável!!!) e dava-lhe algum tempo  para que arranjasse alguém que aceitasse a pasta da Educação. Pretendentes a serem Ministros é coisa que não falta neste país. E fazer pior que Crato seria difícil.
Resta saber até quando é que Nuno Crato se manterá no cargo. Custa acreditar que tenha coragem (ou deveria escrever "falta de vergonha"?) para se manter como Ministro da Educação até às próximas eleições legislativas. Seria único. Nem Miguel Relvas desceu tão baixo!!!
Passos Coelho tem agora como prioridade as próximas legislativas. Sabe que o próximo concurso de professores será fulcral para que o score da coligação não seja um desastre. Por isso (des)espera pela resolução dos problemas na Educação e na Justiça. Será que Passos está à espera do tempo certo para a remodelação (inesperada), por forma a substituir Crato e Teixeira da Cruz? Penso que sim. Custa-me acreditar que os consiga manter por mais um ano. Por isso, aposto que em Novembro (ou, o mais tardar, em Dezembro) teremos algumas caras novas no Governo. Claro que isso não limpa a face do Governo. Bem pelo contrário. Crato ficará marcado pela incompetência na abertura deste ano escolar e por ter implodido, não o MEC, mas sim o processo de colocação de professores e ainda por ter conseguido ultrapassar em arrogância e incompetência a "terrível" Maria de Lurdes Rodrigues.
Entretanto, vamos ver até quando é que continuamos a assistir a este contínuo e diário desenrolar de notícias sobre os erros e as confusões na colocação de professores a abrirem os telejornais e as capas de jornais. Uma coisa é certa: há que elogiar todos os jornalistas que não se têm cansado de mostrar à opinião pública até onde foi a incompetência daqueles que estão à frente do MEC. Só ainda não compreendi porque é que o Prós e Contras da RTP1 ainda não debateu o assunto da colocação de professores...
E lá vamos nós na quinta semana de aulas com milhares de alunos por esse país fora ainda com falta de professores a muitas das disciplinas. Na escola onde dou aulas faltavam ainda, depois de um mês de aulas, cerca de 10 professores. Tenho nove turmas e em todas elas há, pelo menos, um professor em falta. Nalgumas chegam a faltar três (de História, de Físico-Química e de EMRC). Custa a acreditar que tamanha trapalhada pudesse ser possível de ocorrer em pleno século XXI!

domingo, 5 de outubro de 2014

"Quebrou-se-lhes a espinha". Completamente...

Seis anos passaram e as palavras crise e austeridade tomaram conta do vocabulário de todos os dias, o governo mudou, o Ministro da Educação é outro e, no entanto, os professores continuam a ser tratados como se de uns animais domesticáveis se tratassem. 
Há um mês atrás, o Ministro Nuno Crato afirmava que o ano escolar iria iniciar-se sem sobressaltos e com toda a normalidade possível. Passado um mês, os portugueses estão "boquiabertos" com as notícias sobre Educação que todos os dias são emitidas nas televisões. Mau demais. Mas, a tutela continua na mesma como se nada de anormal tivesse ocorrido. 
Relembro as palavras de há seis anos atrás:
"Quebrou-se-lhes (aos professores) a espinha, juntando ao desespero anterior um desespero maior. O ambiente nas escolas é agora de ansiedade, com a corrida ao cumprimento das centenas de regulamentações que desabam todos os dias do Ministério para os professores lerem, interpretarem e aplicarem. Uma burocracia inimaginável, que devora as horas dos professores, em aflição constante para a conciliar com uma vida privada cada vez mais residual e mesmo com a preparação das lições, em desnorte com as novas normas (tal professor de filosofia a dar aulas de "baby sitting" em cursos profissionalizantes) - tudo isto sob a ameaça da despromoção e do resultado da avaliação que pode terminar no desemprego".
E, depois de tamanha irresponsabilidade na abertura deste ano escolar, com prejuízos graves na vida de milhares de famílias, de professores e de alunos, e de mais uma machadada na imagem da classe docente, será que Nuno Crato vai continuar impávido e sereno até ao final do seu mandato como se nada de anormal e grave tivesse ocorrido? Custa a acreditar...