Imagine-se numa escola quase novinha em folha, daquelas em que se gastaram largos milhões de euros, e que para se deslocar da sala de professores até à sala de aula tem de descer 84 degraus, sendo que depois de 90 minutos de aula, volta a ter de regressar à sala de professores e, portanto, ver-se obrigado a subir os mesmos 84 degraus.
Agora há que acrescentar o facto de nessa deslocação ter de se munir do respectivo material de trabalho. A saber: uma pasta com o manual, o dossier do professor e a papelada habitual, outra pasta com o portátil, outra pasta com o projector multimédia e respectiva ficha tripla e ainda o livro de ponto. E, para concluir a peripécia toda, só falta dizer que na dita deslocação ainda se sujeita a ter de levar com alguma chuva, visto que entre o edifício principal e os contentores (sim as obras ainda não terminaram, pelo que ainda há aulas nos chamados monoblocos) a cobertura não é completa e, muitas vezes, está "apinhada" de alunos, pelo que ou leva chapéu de chuva ou ainda apanha com alguns pingos. Finalmente, apenas referir que existe um elevador, mas que o mesmo apenas está indicado para portadores de deficiência.
Pois bem, o que atrás enunciei não é ficção e ocorre numa das escolas que teve a mãozinha da Parque Escolar: a escola onde sou professor. Ora, há dias em que se chegam a descer, no total, à volta de 400 degraus e a subir os mesmos 400 ou mais degraus, em deslocações aos monoblocos para dar as aulas, ao bar para tomar um café ou à reprografia para tirar fotocópias... Ontem dei-me ao trabalho de contar os degraus que percorri: ao final do dia tinha subido e descido um total de 712 degraus (metade em cada sentido).
Esta é daquelas escolas em que se gastaram largas dezenas de milhões de euros em obras de requalificação, quando muitas dessas escolas ainda estavam em boas condições e apenas precisavam de algumas melhorias. Aliás, em muitas das escolas não houve requalificação. Houve sim destruição do que existia e construção de raiz. Até pavilhões gimnodesportivos foram deitados abaixo para se construírem pavilhões novinhos em folha, como se fossemos um país rico. Só na escola onde dou aulas gastaram-se quase 20 milhões de euros! Uma escola de uma vila em declínio populacional que tinha uma escola secundária construída há cerca de duas décadas, ainda em razoáveis condições, com gimnodesportivo, e que foi praticamente deitada abaixo para a construção de uma mega-escola que mais parece uma universidade! Parecemos um país rico...
Esta é daquelas situações que evidenciam até que ponto foi a irresponsabilidade do anterior Governo. Uma escola que até estava em razoáveis condições (das muitas que foram construídas nas décadas de 80 e 90, com três blocos - em forma triangular - mais um bloco maior ao fundo) e foi quase deitada abaixo, quando bastaria que se melhorasse o que existia. Quanto muito poderia ter-se construído mais um bloco de aulas. Mas não! Sócrates lembrou-se de gastar mais dinheiro, sem que o país tivesse recursos financeiros para isso, e avançou com a ideia de requalificar quase todas as escolas deste país. Mas, o disparate foi de tal ordem que muitas das escolas que precisavam urgentemente de obras foram deixadas para o fim do projecto: ainda ontem vi uma reportagem sobre o estado lastimável em que se encontra o Liceu Camões, em Lisboa, construído na década de 1960, que esse sim, precisava de obras de fundo...

A verdade é que tivemos um primeiro-ministro que se preocupou em fazer muita obra, ignorando a sua necessidade, utilidade e forma de se pagar. É que qualquer um consegue ser primeiro-ministro de um país em que se manda fazer obra para que outros a paguem...