domingo, 9 de dezembro de 2012

Esclarecer os ignorantes ou os que se fazem de ignorantes...

Há quem pense que é um ultraje um(a) professor(a) aposentar-se ao fim de 35 anos de serviço e levar para casa uma reforma mensal de 1300 euros limpos, ou seja, quase 1800 euros brutos. 
Ora, os que pensam desta forma deveriam abrir os olhos para os tempos que vivemos, não só a nível financeiro, mas sobretudo em termos demográficos.
Para esses que ainda não perceberam os tempos de mudança que vivemos vou apenas fazer umas contas que julgo serem simples de entender. Pelo menos os meus alunos do básico percebem.
Primeira nota:
Agora vamos supor que esse(a) professor(a) se reforma ao fim de 35 anos de serviço com 60 anos de idade e vive até aos 85 anos (isto tendo em conta a esperança média de vida). Esse(a) professor(a), recebendo uma reforma mensal líquida de 1300 euros irá ao longo dos 25 anos de aposentação receber do Estado um valor total de quase 400 mil euros.
Agora é só comparar os valores (200 mil euros de contribuição e 400 mil euros de reforma) para se perceber porque é que o Estado Social, tal e qual como o conhecemos, é inviável.
Segunda nota:
Agora vamos esclarecer como funciona o sistema de Segurança Social em Portugal. Ao contrário do que muita gente pensa o sistema português funciona tendo por base um princípio intergeracional. Isto quer dizer que quando se desconta durante a vida activa estamos a contribuir para a reforma daqueles que já se reformaram. Ou seja, quando descontamos não estamos a fazer a nossa própria reforma.
Ora, o sistema actualmente em vigor tem a sua lógica de existir partindo de três pressupostos que existiam quando este sistema foi criado: o predomínio de uma pirâmide etária crescente, onde o número de jovens era superior ao número de idosos, uma relação entre as contribuições e as despesas tidas com as reformas favorável às contribuições e, finalmente, uma situação onde a diferença entre a idade da reforma e a esperança média de vida não superava os 20 anos.
Neste momento, nenhum destes três pressupostos existe, o que explica a falência do sistema de Segurança Social. De facto, o que temos hoje em dia é uma pirâmide etária cada vez mais decrescente, onde o índice de envelhecimento não pára de aumentar e onde as pessoas vivem cada vez mais anos.
Mas, há quem prefira assobiar para o lado e, fazendo de conta que não sabe nada sobre as profundas transformações sociais e demográficas que ocorreram nas últimas duas décadas, apenas olha para o seu próprio umbigo. A ideia destes umbiguistas é simples: "o Estado Social não está em falência, pelo que não quero que mexam nos direitos adquiridos". Como se os direitos concedidos num determinado contexto histórico não pudessem ser alterados ou até retirados, por via das transformações socio-económicos ocorridas! Como se os direitos concedidos fossem imutáveis!
Vou dar apenas o meu caso concreto: comecei a leccionar aos 21 anos de idade e vou no meu 15º ano consecutivo como professor. Caso a idade da reforma esteja nos 67 anos de idade daqui a três décadas, isso quererá dizer que tive de trabalhar 46 anos para me poder reformar. Ora, nessa altura, apesar de ter contribuído para a renovação de gerações de Portugal (visto que sou pai de duas crianças) e apesar de já ter quase 15 anos de contribuições para a Segurança Social (na altura serão 46 anos de contribuições), o mais certo é não vir a ter direito a uma reforma que se aproxime do valor da reforma dos que actualmente se aposentam.
Por isso, há que alterar por completo o sistema de Segurança Social em vigor, mesmo correndo-se o risco de, uma vez mais, se proceder a uma reforma que é impopular e incompreendida por aqueles que são pouco letrados, mas também por outros que se julgam letrados, mas que só olham para o seu umbigo.
Assim, parece-me claro que aqueles que agora se reformam com um valor de 1300 euros limpos ao fim do mês se deveriam dar por muito contentes e satisfeitos por ainda terem direito a uma situação que muitos daqueles que têm menos de 50 anos de idade não terão qualquer hipótese de sonharem vir a ter.
Esperam-se medidas radicais para breve. Depois não digam que não foram avisados...

9 comentários:

Agnelo Figueiredo disse...

O que escreveu é bem verdade.
O pior é que há muitos tipos, como eu, que andaram a descontar a vida toda para pagar chorudas pensões a outros tipos e agora a malta nova não quer pagar as nossas.
Um problema do caraças.

Anónimo disse...

Então qual será, na sua informada e isenta opinião, a reforma justa para um professor que se reforma com 35/40 anos de serviço? É curiosidade genuína, garanto-lhe.
Francisco

Anónimo disse...

Perfeitamente de acordo com a análise do Pedro.

Marta

Pedro disse...

Caro Agnelo, penso que a questão principal não é a malta nova não querer pagar as reformas dos mais velhos. A questão é que o Estado não terá dinheiro para pagar as reformas dos mais velhos, quanto mais as dos mais novos.

Caro Francisco, já aqui escrevi e volto a escrever. Tendo em conta o que hoje em dia aufere um professor com 20 anos de carreira (cerca de 1400 euros limpos)e ainda os anos que lhe faltam para se reformar (recorde-se que a idade da reforma passou para os 65 anos) penso que uma reforma líquida de 1400 euros mensais é mais do que suficiente para colegas que se estão a reformar com 35 anos de carreira (muitos deles com 60 anos de idade e, portanto, com uma esperança média de vida ainda de cerca de 20/25 anos).
Tenho colegas a reformarem-se com 35 anos de serviço e 60 anos de idade e a levarem para casa 1700 euros limpos. Ora, quem esteja na minha situação (36 anos de idade e 15 anos de serviço) terá de trabalhar pelo menos mais 30 anos para se poder reformar e, certamente terá direito (se tiver direito) a uma reforma bem inferior à que agora é concedida.
Portanto, não compreendo que haja colegas a reformarem-se com 35 anos de serviço com uma reforma de 1700 euros limpos por mês e ainda se queixem que a reforma é baixa.

Gorgi disse...

Agora ainda se podem reformar antes dos 65 anos com reformas de 2000 euros ou até maiores e ainda se queixam!
Então o que dizer dos que estão a meio da carreira e só vão poder reformar-se aos 65 anos e com reformas bem mais inferiores do que as atuais?

Lurdes disse...

O ataque aos seus colegas mais velhos continua, não é?
Gostaria de o ver aos 65 anos a ter a mesma conversa de agora.

Pedro disse...

Cara Lurdes, o que você vê como um ataque eu vejo apenas como a expressão de uma opinião pessoal que penso estar minimamente fundamentada e contextualizada aos tempos que atravessamos.
A Lurdes pode discordar do que penso, mas não há aqui nenhum ataque. Apenas escrevo sobre um assunto de que muito se tem falado: a corrida de muitos professores às reformas.

Conceição disse...

É um tema complicado. Mas convenhamos que nos dá muito jeito que os colegas mais velhos se reformem depressa para que os horários zero não aumentem. E já nem falo dos contratados.
É que agora até já se fala em aumentar o horário dos professores.

Luísa disse...

Tomara eu poder reformar-me com 1500 euros por mês!