terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Obrigado Ana Leal

A jornalista da TVI Ana Leal fez um excelente trabalho de investigação jornalística acerca do destino que é dado aos dinheiros públicos no âmbito dos contratos de associação com o ensino particular. Focou-se essencialmente no grupo de ensino GPS e nas ligações deste grupo com o poder político. Deu ainda a conhecer as condições de trabalho que vigoram em muitos dos colégios com contratos de associação e deu ainda atenção às situações relacionadas com o "fabrico" de notas dos alunos para interesse destas escolas.
É uma reportagem televisiva que aconselho vivamente o seu visionamento e que, para já, culminou numa primeira consequência: a realização de uma auditoria por parte do Ministério da Educação ao grupo GPS.
- Como se explica que alguns colégios com contrato de associação recebam um determinado montante de dinheiros públicos e que as despesas de vencimentos desses colégios sejam de cerca de 50% desse valor, quando no público, esse valor chega quase aos 80%? Para onde vai o resto do dinheiro? Para despesas "encobertas"? Ou para despesas particulares de quem está à frente destes colégios? A auditoria às contas deve ser clara e objectiva...
- Como se explica que as inspecções a estes colégios (a mesma crítica poderia ser feita às escolas públicas) sejam feitas com aviso prévio? Qual o objectivo deste aviso? Nunca percebi a lógica dos dias e horas a que são feitas as inspecções às escolas serem previamente conhecidas, já que uma inspecção séria deveria ser feita sem qualquer aviso prévio. Só assim se poderá ter conhecido real de como as escolas funcionam...
- Como se explica que uma escola secundária recentemente intervencionada tenha excelentes condições, com salas de aula e laboratórios devidamente equipados, e que perca alunos para um colégio concorrente com contrato de associação, originando o claro sub-aproveitamento de uma escola pública onde foram gastos milhões de euros (o caso que cito ocorre nas Caldas da Rainha)
- Como se explica as ligações mais que duvidosas entre antigos governantes (do PS e do PSD) e o grupo GPS, e que podem pôr em causa o princípio da imparcialidade, dado que enquanto governantes muitos destes políticos (antigos secretários de estado da Educação) decidiram o valor que estes colégios iriam receber e depois de saírem do Governo foram trabalhar para estas empresas privadas. Parece-me uma clara situação de incompatibilidade de funções...
- Como se explica que se critique tanto as parcerias público-privadas rodoviárias e depois tenhamos na área da educação uma situação muito semelhante, em que se entregam dinheiros públicos para as mãos de empresas privadas, cujo principal objectivo, é a obtenção de lucros...
Finalmente, há que elogiar este tipo de jornalismo que vai muito além da mera crítica fácil. Na reportagem, todas as partes (Ministério, grupos privados, professores, encarregados de educação) tiveram oportunidade de serem ouvidos. As dúvidas que surgem são fundamentadas com dados e testemunhos concretos. É, pois, urgente que esta reportagem tenha consequências e que os serviços de inspecção do ME não venham com conclusões inócuas. Seria também importante que o próprio Nuno Crato falasse sobre o assunto e viesse defender a escola pública. O caso concreto das Caldas da Rainha é flagrante...
No futuro, tendo em conta as mudanças demográficas e os investimentos que foram feitos no parque escolar público, seria bom que Nuno Crato viesse esclarecer que os contratos de associação com empresas privadas tem os dias contados e que as escolas públicas têm todas as condições para receberem os alunos que queiram estar no ensino público. Quem quiser ir para o privado que pague do seu bolso...

10 comentários:

Sónia disse...

Pedro, gostaria de o chamar à atenção que os contratos de associação não são todos iguais. Como sabe aqui em Viseu existem duas escolas que funcionam com contrato de associação e se não fossem essas escolas, alguns milhares de alunos não tinham escola para onde ir.
É que, como sabe há falta de escolas públicas em Viseu, pois a população aumentou muito e as escolas há muitos anos que são as mesmas.
Portanto não faz sentido dizer que as escolas com contrato de associação são todas iguais e que não devem ter apoios do Estado.
Se houver dúvidas sobre o grupo GPS então que se investigue. Agora dizer que só devem existir escolas públicas ou privadas não me parece correto nem sério da sua parte.
Digo-lhe ainda que os professores que lecionam nestas escolas merecem o mesmo respeito que os colegas das escolas públicas e que nem todos os colégios funcionam da mesma forma que os do grupo GPS retratados na reportagem. Sei do que falo, pois tenho uma familiar muito próxima que dá aulas num dos colégios de Viseu (o da Via Sacra que deve conhecer)e não tem razões de queixa da Direção.
Há cidades onde as escolas com contrato de associação fazem todo o sentido existirem e Viseu é apenas o exemplo de um cidade onde isso acontece.

Gorgi disse...

Excelente reportagem. É bom que se saibam as verdades.

Agnelo Figueiredo disse...

Achei a reportagem, globalmente, uma merda.
Foi feita num tom acusatório, preconceituoso e, sobretudo, como "luta de causas".
Uma reportagem quer-se, essencialmente, informativa, e isso implica a não formulação de juízos de valor.
Por outro lado, não permitiu o exercício do contraditório. Sempre que os tipos do GPS iam começar a falar, para explicar, logo a jornalista cortava e mudava de plano.
Péssimo!
Finalmente, dada tenho contra o "lucro". O lucro é a mola real do progresso da humanidade. Há, contudo, uma obrigatoriedade: que se cumpra a Lei.

Agnelo Figueiredo disse...

"nada"

Pedro disse...

Cara Sónia, conheço as escolas a que se refere. Embora não saiba ao pormenor como funcionam as ditas escolas, tenho a ideia de que uma das razões que levaram a que não se construísse uma nova escola básica e secundária em Viseu na última década foi precisamente o facto dessas duas escolas estarem como que a "substituirem" a escola pública.
Bem sei que a população de Viseu aumentou em cerca de 10000 habitantes, pelo que uma nova escola (ou o alargamento das existentes) torna-se imprescindível.
As duas escolas de que fala recebem centenas de milhares de euros por ano do Estado e interessa-lhes que não seja construída nenhuma nova escola.
Não me acredito que o Estado construa uma nova escola, pelo que as referidas escolas com contrato de associação são necessárias à rede pública. Mas, convém que as inspecções sejam feitas de forma rigorosa, por forma a que não acontece o que, pelos vistos, acontece no grupo GPS.
O ideal, na minha opinião, era que apenas existissem escolas públicas e privadas. A terceira opção (as que têm contrato de associação) justificaram-se quando se deu o boom da educação na década de 1980 e 1990. Agora, penso que começam a não fazer sentido, pelo que não se justifica o seu aumento, sob pena de termos uma rede pública sub-aproveitada.
Mas respeito a sua opinião. Volte sempre.

Pedro disse...

Caro Agnelo, é verdade que a reportagem vai mais além da mera informação. É também opinativa. Mas, hoje em dia, o que mais existe no jornalismo é opinião.
Discordo de que apenas uma das partes foi ouvida e de que a outra foi coartada no exercício do contraditório.
Aliás, penso que a jornalista teve a preocupação de ouvir todas as partes envolvidas.
O que a reportagem mostra é demasiado grave e, das duas uma: ou a auditoria, entretanto iniciada, prova que há outros interesses instalados ou a jornalista merece um processo em tribunal por difamação. Eu inclino-me mais pela primeira opção. Por isso, concordo consigo num aspecto: que se cumpra a Lei.

Maria disse...

Você a criticar os contratos de associação? Não se enganou?
Não é você que só vê virtudes neste governo neoliberal? Veja lá se no seu partido não vai ser punido por andar a dizer mal dos colégios apoiados pelo Estado?

Helena disse...

A Escola Pública tem de ser defendida.
Esta reportagem mostra a vergonha a que se chegou em matéria de Educação. Este grupo GPS e se calhar outros fazem da Educação um mero negócio cujo único objectivo é o lucro.

Isabel disse...

LOL...ao que você chegou , Pedro. Já viu que você é um paradoxo vivo?

Pedro disse...

Cara Maria, não percebo qual a razão da sua admiração. Por um lado, não penso que este seja um governo neoliberal. Por outro lado, não considero que este governo seja só de virtudes.
Fique também sabendo que, apesar de me identificar com o PSD, isso não quer dizer que não tenha opinião própria. E se tiver de criticar o PSD por uma determinada opção não terei problemas em fazê-lo. Esta lógica das PPP`s na área da educação é apenas um exemplo disso mesmo. O PSD pode concordar, mas eu discordo.
Acredite que não tenho nenhuma cartilha partidária que sigo de forma absoluta. Isso é mais do género dos partidos da esquerda redical.

Cara Isabel, não vejo nenhum paradoxo. O que vejo é muita gente com um pensamento radical e populista. E, pior ainda, vejo muitos blogues onde abunda a crítica fácil, mas com uma base argumentativa muito fraca...