quinta-feira, 30 de maio de 2013

O caso da professora que mordeu o aluno. Ir para além do óbvio...

Deu nos noticiários da noite dos três canais generalistas. O Correio da manhã fez questão de fazer manchete com o sucedido. O resto já sabemos. Pelo que ontem fui ouvindo na sala de professores, no café ou simplesmente lendo as caixas de comentários que surgiram na análise deste caso, são notórias duas posições distintas. 
Há quem critique a professora pela atitude tomada, num gesto que evidencia a clara perda de paciência e/ou a falta de capacidade da docente para gerir situações difíceis ocorridas com os alunos. 
Há também quem compreenda a atitude da docente e critique os pais do miúdo por não saberem dar educação à criança, preferindo a atitude de se queixarem em vez de o repreenderem. Alguns chegam a elogiar a professora e compreendem a sua atitude, como um gesto de desespero, numa lógica de "coitada, perdeu a cabeça" ou "podia acontecer a qualquer um de nós". 
Escuso-me de elogiar ou criticar qualquer uma destas posições. Isso seria demasiado fácil, embora, entre as suas análises, me incline claramente para a primeira posição. Contudo, não há nada como saber toda a história, do princípio ao fim e, nomeadamente, os seus antecedentes para avaliar todo o caso.
No entanto, penso que seria mais importante que se fosse para além do óbvio: a condenação ou a defesa da professora. 
Cada vez mais se nota que os problemas de âmbito disciplinar acorrem em anos de escolaridade mais baixos. Se há uns anos atrás era no 3º ciclo que ocorriam a maior parte dos problemas ao nível das atitudes (era aquela a que se apelidava a idade da "parvalheira"), nota-se, cada vez mais, que a rebeldia surge numa idade mais precoce. Assim, torna-se imprescindível que a sinalização (e consequente intervenção) dos casos mais complicados ocorra logo nos 1º e 2º ciclos. 
Por outro lado, há que não esquecer que, se ao nível dos alunos do 3º ciclo, os problemas que ocorriam há uns anos atrás eram menos gravosos dos que surgem actualmente, pelo facto do abandono escolar há mais de dez anos atrás apresentar valores bastante elevados (pelo que os alunos problemáticos eram afastados da escola), hoje em dia, temos uma Escola massificada, onde convivem, no mesmo espaço, os alunos que estão na escola porque querem estar e têm gosto em estar, mas também os alunos que detestam a escola  e que, muitas vezes, acabam por ter nos PCA`s, nos CEF`s, nos PIEF`s e nos profissionais o seu destino traçado, esperando-se que os professores façam autênticos milagres no sentido de os conseguir "resgatar" para a importância de que estes aprendam um ofício ou dêem um rumo novo à sua vida escolar. 
No início da semana, Eric Hanushek, um especialista em Economia da Educação afirmava no Público que os professores “devem ser responsabilizados pelo desempenho dos alunos”, omitindo a diversidade de turmas que um professor pode ter. Um professor pode ser excelente com bons alunos e ser um completo desastre com alunos de um CEF. O oposto também pode acontecer. Se para uns casos o conseguir excelentes notas é o mínimo dos mínimos, para outros o sucesso está em evitar o abandono escolar e conseguir captar a atenção dos alunos para o que se ensina na sala de aula... 
No dia seguinte, o Público trazia outra notícia da Educação: "Comissões de protecção acompanharam mais crianças e jovens: 69 mil, em 2012. Registaram-se mais 27 mil novos casos. E disparou o número de jovens que se colocam a eles próprios em perigo". A prova de que cada vez é mais difícil ser-se professor e que, portanto, os tempos do professor "debitador" de matéria já lá vai... Torna-se cada vez mais evidente que, para muitos casos que nos chegam à escola, a aposta na "formação" e na "educação" é mais decisiva do que a mera transmissão do conhecimento. 
Nos últimos cinco anos lectivos tive sempre pelo menos uma turma do CEF, do profissional ou do PCA. E, em todas estas turmas vi situações que há uns anos atrás daria origem à solução mais simples, mas mais errada: o abandono precoce da escola. Agora, aqueles que saíam da escola com 13 anos (ou até menos) ficam por cá até aos 18, 19, 20 ou até mais anos e a grande vitória para qualquer professor destes alunos é conseguir resgatá-los para a adopção de atitudes correctas e para a aprendizagem de um ofício. Tarefa hercúlea... 
Assim, é importante que as escolas apostem (e para isso têm de ter meios para tal) não só no diagnóstico precoce de situações complicadas, mas também no apoio e na intervenção especializada destes casos. A função do professor-tutor é, nos dias de hoje, decisiva. Por outro lado, a formação dos professores para saberem actuar neste tipo de casos deve ser uma preocupação das próprias escolas e do Estado...

4 comentários:

Unknown disse...

Sem redução de horas lectivas, sem formação específica, com 30 e mais alunos dentro da sala 25 horas por semana, e a ganhar cada vez menos???? Pedro, somos professores não somos cruzamentos entre o super homem e um santo mártir!

João Fonseca disse...

É muito simples. É um caso para a polícia resolver. E claro que a senhora deve ter um processo disciplinar. A má educação do aluno não pode justificar a má educação da professora.

Anónimo disse...

Também há alunos que batem nas professoras. Mas isso já nem é notícia.

http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/ensino/professora-leva-pontape-no-peito

Anónimo disse...

E eu... há mais de três anos que trabalho com PIEF, sei bem o significado de hercúleo, com você referiu, será que você sabe?
99% do nosso trabalho redunda, já normalmente, em frustração profissional e, também muitas vezes, pessoal, no entanto, é como você disse
«(...) a grande vitória para qualquer professor destes alunos é conseguir resgatá-los para a adopção de atitudes correctas e para a aprendizagem de um ofício.»

É isso que me faz continuar ano após ano (até que me despeçam, me desvinculem, me mandem para a mobilidade, me dêem um chuto nas nalgas), sempre que um dos miúdos é bem sucedido, isso compensa tudo o resto!

Um abraço